SIMCAERJ COBRA MELHORIAS NO SAMU E SALÁRIO DA CATEGORIA - Crise na saúde: um terço das ambulâncias d
Ambulância inoperante na base do Samu na Avenida Brasil Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
RIO — O serviço de atendimento do Samu está entrando em colapso na cidade do Rio. Fontes revelaram ao GLOBO que, hoje, 33% das ambulâncias estão inoperantes. Números do sindicato mostram que a crise é ainda maior: menos da metade da frota prevista para atender a população segue em operação. Dos 82 veículos estimados no contrato entre a Secretaria estadual de Saúde (SES) e a empresa OZZ Saúde, 40 eram alugados e foram retirados de circulação no fim de junho, quando o Tribunal de Justiça suspendeu os repasses do governo do estado à empresa. Com isso, das viaturas restantes, propriedades do estado, um terço está inoperante por falta de pessoal e de manutenção.
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— O Samu está entrando em colapso. As viaturas que eram propriedade do estado e estavam com o Corpo de Bombeiros são antigas, já apresentavam avarias e precisam de manutenção frequente, o que não acontece desde o início de julho — explica Henrique Júnior, presidente do Sindicato dos Motoristas Condutores de Ambulância do Rio.
Desde o início do mês, as ambulâncias que apresentam qualquer tipo de defeito ficam inoperantes, paradas nas bases do Samu espalhadas pela cidade. Os funcionários reclamam de falhas nas baterias, pneus carecas e até parafuso soltos. Se, no início do mês, o número de carros fora de circulação era de 10%, nesta semana chegou a um terço. Os motoristas também relatam que as ambulâncias estão circulando com o mínimo de combustível possível. Médicos e enfermeiros também denunciam a falta de oxigênio, máscaras e toucas descartáveis no combate à Covid-19.
— A cidade do Rio é muito grande para a quantidade de ambulâncias, o que sobrecarrega as equipes, que chegam a fazer até 18 ocorrências num único dia. O ideal, sem desgastes excessivos, seriam oito. É quase um atendimento por hora, o que muitas vezes nos faz ficar sem almoçar, sem descanso, sob estresse o dia inteiro. E aí isso acaba refletindo num atendimento demorado, prejudicando a população — conta um funcionário do Samu, sem querer se identificar.
Segundo ele, atendimentos simples são agravados pelas dificuldades.
— Já vi princípios de infarto, que poderiam ser controlados, virarem óbito. Infecções agravarem em questão de horas, porque o paciente espera na clínica na família e não consegue a transferência para o hospital para internação, porque não tem ambulância. Além disso, muitos atendimentos nas ruas acabam sendo feitos por meios próprios, pela demora na chegada do veículo de socorro. E isso pode agravar o estado de saúde da vítima, se não for bem feito.
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Além de viaturas, também faltam motoristas, enfermeiros e médicos para trabalharem nos veículos: os funcionários, sem receber pagamentos da OZZ Saúde, também pararam de trabalhar. Nesta quinta-feira, profissionais das saúde, incluindo funcionários do Samu, fizeram uma manifestação na Avenida Brasil reivindicando por melhores condições de trabalho e contra o atraso de salários. Enfermeiros e técnicos em enfermagem já declararam greve. O Sindicato dos Médicos do Rio (SinMed) convocou para a próxima terça-feira uma assembleia para deliberar sobre o assunto.
Funcionários do Samu fazem protesto contra salários atrasados há dois meses Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo
Funcionários do Samu fazem protesto contra salários atrasados há dois meses Foto: Fabiano Rocha / Agência O Globo.
Em nota, o SinMed informa que é "crescente" a preocupação com a situação do Samu no Rio. "Os trabalhadores, contratados de forma precária, estão há meses sem receber salários e benefícios; as viaturas, sem manutenção; e a população, desassistida. Solicitamos a atenção de todos para a questão, pois vidas estão em risco", diz a nota.
— Somos moralmente assediados, sem local adequado para descanso, não temos horários de almoço e janta, nem pausa para ir ao banheiro. Há plantões com mais do que o dobro de atendimentos da quantidade ideal. Sem pagamento, muitos médicos não estão indo trabalhar e as ambulâncias apenas com técnicos e enfermeiros acabam recebendo casos gravíssimos que deveriam ser direcionados a ambulâncias avançadas onde há dois profissionais de nível superior — relata um funcionário do Samu, que não quis se identificar por medo de represálias.
Justiça suspendeu os repasses do governo à empresa
Em março, a OZZ Saúde foi contratada em regime emergencial pelo prazo de 180 dias, no valor total de R$ 166,5 milhões para operar o Samu na cidade do Rio. Três meses depois, a Justiça, a pedido do Ministério Público estadual, suspendeu os repasses do governo do estado à empresa. O MP se baseou num relatório da Procuradoria da própria Secretaria estadual de Saúde, que identificou indícios de irregularidades e de superfaturamento no contrato.
Segundo o documento, feito pela própria equipe jurídica da secretaria, houve violações nos princípios "da competitividade, economicidade e da isonomia" durante o processo. O caso também está sob análise do Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ). Com a suspensão dos repasses, os salários dos funcionários também foram suspensos. Uma decisão da Justiça do Trabalho determinou o depósito judicial do valor do pagamento aos trabalhadores. Mas a determinação ainda está sob análise da Procuradoria Geral do Estado (PGE-RJ).
O diretor da Ozz, Eduardo Zardo, conta que a empresa não tem mais recursos para fazer o pagamento das equipes, insumos e combustível para as ambulâncias. Zardo alega ainda que, além da redução da frota, as equipes são responsáveis por atendimentos que não deveriam ser tarefa dos médicos do Samu, como constatação de óbitos. — Recebemos apenas R$ 25 milhões, que investimentos em carros, treinamento de pessoal e medicamentos. Hoje, a dívida está quase em R$ 60 milhões e já há fornecedores que não querem mais fazer negócio com a gente. Pode ser que tudo piore nas próximas semanas — argumentou: — Provamos para a secretaria que trabalhamos com preços de março, que já estão bem abaixo dos praticados hoje. A máscara que era R$ 3, hoje está custando R$ 27.
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Secretário informa novo edital para gerir o Samu
Nesta terça-feira, o secretário de Estado de Saúde, Alex Bousquet, anunciou que será lançado ainda esta semana um novo edital para escolher por licitação a empresa que vai substituir a OZZ na gestão do Samu no município do Rio. De acordo com a pasta, os salários ainda não foram pagos porque “o contrato com a OZZ é objeto de duas decisões judiciais em sentido contrário. Por decisão da Justiça comum, a Secretaria de Estado de Saúde está impedida de fazer qualquer repasse de dinheiro à OZZ”. A SES expressa sua solidariedade à dificuldade enfrentada pelos funcionários.
A secretaria informou, em nota, que a Procuradoria Geral do Estado (PGE) "analisa a questão para tornar possível o depósito judicial (R$ 10 milhões, referentes aos vencimentos) sem ferir nenhuma determinação legal . A SES já manifestou oficialmente a intenção de fazer o depósito dos salários, mas a avaliação final é da PGE”.
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Quanto à frota, a secretaria argumenta que a “OZZ Saúde opera o serviço do Samu da capital do estado desde 30 de março. Portanto, período suficiente para avaliar e solucionar supostos problemas da frota”. De acordo com a Secretaria estuadual, seis viaturas zero quilômetro foram cedidas no início da gestão da OZZ Saúde, em março.
Entenda o processo
De acordo com a ação, o contrato, que foi realizado em caráter emergencial e sem licitação, era destinado à prestação de serviços de gestão, administração e execução de regulação e intervenção médica de urgência nas áreas atendidas pelo Samu, pelo prazo de 180 dias, no valor total de R$ 166,5 milhões, a ser pago em seis parcelas de R$ 27,7 milhões. O texto foi subscrito pelo subsecretário Gabriel Neves — preso no dia 7 de maio, por fraudes na compra de ventiladores pulmonares para a rede estadual, na operação Mercadoria do Caos, conduzida pelo Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (GAECC/MP-RJ).
Já o ex-secretário Edmar Santos foi mencionado no processo porque omitiu-se quanto ao controle e à fiscalização, uma vez que é tarefa do superior hierárquico a revisão de todos os atos praticados no âmbito de sua gestão. Desta forma, o MP solicitou o ressarcimento integral aos cofres públicos, além da perder a função pública ocupada por ambos e serem suspensos dos seus direitos políticos pelo prazo de cinco a oito anos. Com relação à Ozz, a ação requer o impedimento de fechar contratos públicos ou de receber incentivos fiscais ou creditícios, por cinco anos.
A juíza Regina Lúcia Chuquer, da 6ª Vara de Fazenda Pública do Rio, concedeu, então, uma liminar para suspender o pagamento, feito pelo Estado à Ozz Saúde Eireli, cujo valor total seria de R$166.553.101,02. Também determinou que a empresa deverá continuar cumprindo o contrato, sem interrupções, “diante de todo o pagamento já feito”.